Pensamento Constitucional do Jurista Cláudio Lembo e Sua Visão da Democracia Brasileira

 Cláudio Lembo, renomado jurista, professor, ex-governador de São Paulo e figura influente no campo do Direito Constitucional brasileiro, desenvolveu ao longo de sua carreira reflexões profundas sobre a democracia e o papel do direito na construção e manutenção de um Estado democrático. Embora Lembo não seja amplamente conhecido por uma única tese acadêmica formal no formato tradicional (como uma dissertação ou monografia específica), suas ideias emergem de maneira consistente em seus artigos, livros, entrevistas e pronunciamentos públicos. A partir de uma análise de sua trajetória e contribuições, é possível consolidar uma tese central que permeia seu pensamento: **a democracia brasileira é frágil e depende de um direito constitucional vivo, interpretado à luz da soberania popular e da resistência contra elites autoritárias, mas enfrenta desafios estruturais que a tornam, muitas vezes, uma fachada institucional.**


### Fundamentos da Tese de Cláudio Lembo

Lembo parte de uma visão crítica sobre a democracia brasileira, que ele frequentemente descreve como "frágil", "falsa" ou "de fachada". Essa percepção está ancorada em sua análise histórica e sociológica do Brasil, um país marcado por desigualdades profundas e por uma elite que, segundo ele, historicamente resiste à inclusão social e ao pleno exercício da soberania popular. Para Lembo, o direito, especialmente o constitucional, deveria ser o instrumento de fortalecimento da democracia, mas sua aplicação prática no Brasil frequentemente se desvia desse ideal, sendo capturado por interesses elitistas ou por uma judicialização excessiva que distancia o povo do poder.


Um dos pilares de seu pensamento é a ideia de que a Constituição de 1988, embora um marco na redemocratização, tornou-se "secundária" diante de interpretações e práticas que subvertem seus princípios fundamentais, como a presunção de inocência e a soberania popular. Ele argumenta que o Judiciário, ao invés de atuar como guardião da democracia, tem se politizado, assumindo papéis que extrapolam sua competência e enfraquecem a vontade do povo. Um exemplo recorrente em suas falas é o caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cuja perseguição judicial Lembo considera um símbolo da deterioração democrática e da instrumentalização do direito contra a vontade popular.


### Aprofundando os Pensamentos de Lembo

1. **Democracia como Processo Social, Não Apenas Institucional**  

   Lembo enfatiza que a democracia não pode ser reduzida a um conjunto de normas ou instituições formais. Em suas reflexões, ele destaca que o funcionamento efetivo de um regime democrático exige a participação ativa da sociedade. Em uma entrevista à *Consultor Jurídico* em 2020, ele afirmou que a única saída para os retrocessos democráticos é a "movimentação social", sugerindo que o povo deve ser o protagonista na defesa de seus direitos, especialmente quando as instituições falham. Essa visão dialoga com a ideia de que o direito, por si só, não garante a democracia se não estiver alinhado com uma conscientização e mobilização coletiva.


2. **Crítica à Elite Branca e ao Autoritarismo Velado**  

   Um conceito recorrente em seu discurso é o papel da "elite branca" como obstáculo à consolidação democrática. Em 2006, enquanto governador de São Paulo, Lembo usou essa expressão para criticar a reação de setores privilegiados aos ataques do PCC, mas ampliou essa análise ao longo dos anos para abordar a resistência histórica dessas elites à igualdade e à justiça social. Para ele, o direito no Brasil muitas vezes serve como ferramenta de perpetuação desse poder elitista, em vez de promover a emancipação das maiorias. Em 2018, durante um debate sobre a Lei da Ficha Limpa, ele afirmou que a "inveja" dessa elite em relação a Lula reflete um desprezo por lideranças populares que desafiam o status quo.


3. **O Direito Constitucional como Garantia e Limite**  

   Como professor de Direito Constitucional, Lembo acredita que a Constituição deve ser o fundamento da democracia, mas alerta contra sua instrumentalização. Ele critica decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), como as que flexibilizaram a presunção de inocência, por considerá-las violações claras do texto constitucional. Para Lembo, o direito deve ser um limite ao arbítrio do poder, mas também um instrumento de garantia da vontade popular, e não um mecanismo de tutela judicial que substitua a política democrática.


4. **A Fragilidade Institucional e o Risco de Retrocesso**  

   Lembo vê a democracia brasileira como um projeto inacabado, suscetível a retrocessos autoritários que não necessariamente assumem a forma de golpes militares tradicionais. Em suas palavras, "não há golpe de estado pelas forças armadas, há golpe de estado por outras formas". Ele aponta o impeachment de Dilma Rousseff em 2016 e a Operação Lava Jato como exemplos de rupturas democráticas disfarçadas de legalidade, nas quais o direito foi usado para legitimar ações políticas contra a soberania popular.


### Implicações e Relevância

A tese de Lembo sobre democracia e direito reflete uma visão pessimista, mas não resignada, do cenário brasileiro. Ele reconhece os avanços da Constituição de 1988, como a ampliação dos direitos fundamentais, mas insiste que sua efetividade depende de uma sociedade vigilante e de um Judiciário que respeite os limites de sua função. Sua crítica à judicialização excessiva e à politização do direito antecipa debates contemporâneos sobre o papel do STF e do Ministério Público na democracia brasileira.


Além disso, Lembo oferece uma perspectiva única por combinar sua experiência acadêmica com sua vivência política. Como ex-governador e integrante de partidos conservadores (como a ARENA e o PFL), ele surpreende ao adotar posições progressistas em defesa da soberania popular e contra abusos judiciais, o que demonstra uma evolução em seu pensamento e uma rejeição ao conservadorismo elitista que marcou parte de sua trajetória inicial.


### Conclusão

A tese de Cláudio Lembo pode ser sintetizada como uma defesa da democracia participativa e do direito como instrumentos de emancipação, confrontados pela realidade de uma democracia frágil, manipulada por elites e enfraquecida por instituições que, paradoxalmente, deveriam protegê-la. Ele propõe que a superação dessa fragilidade exige não apenas um direito constitucional fiel à soberania popular, mas também uma sociedade ativa que resista às distorções do sistema. Suas ideias continuam relevantes em um Brasil que, em 2025, ainda enfrenta desafios semelhantes aos que ele analisou, como a tensão entre judicialização, política e participação popular.

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