A Segurança Jurídica como Pilar Inviolável do Estado de Direito: Uma Análise sob a Perspectiva da Estabilidade Normativa e da Confiança Legítima

Resumo: Este artigo defende a tese de que a segurança jurídica, enquanto princípio estruturante do Estado de Direito, não pode ser mitigada em nome de critérios como informalidade, celeridade e economia processual. Propõe-se uma abordagem inédita, centrada na estabilidade normativa e na confiança legítima, analisando a tensão entre eficiência processual e a garantia do devido processo legal. Com base em doutrina, jurisprudência e artigos de revistas jurídicas, argumenta-se que a segurança jurídica é a base para a previsibilidade e a proteção das relações jurídicas, sendo essencial para a manutenção da ordem social e a legitimidade do sistema jurídico.


1. Introdução


A segurança jurídica é um dos pilares fundamentais do Estado de Direito, garantindo a previsibilidade, a estabilidade e a confiança nas relações jurídicas. Contudo, a busca por informalidade, celeridade e economia processual tem, em algumas ocasiões, colocado em xeque os princípios do devido processo legal e da segurança jurídica. Este artigo propõe uma análise inovadora, defendendo a tese de que a segurança jurídica, expressa pela estabilidade normativa e pela confiança legítima, constitui um valor inegociável, cuja preservação é essencial para a legitimidade do sistema jurídico.


A metodologia empregada combina análise doutrinária, exame de jurisprudência e revisão de artigos publicados em revistas jurídicas, com o objetivo de demonstrar que a flexibilização de garantias processuais em nome da eficiência não pode comprometer a segurança jurídica. A tese defendida é que a estabilidade normativa e a confiança legítima são elementos indissociáveis da segurança jurídica, funcionando como salvaguardas contra a arbitrariedade e a incerteza jurídica.


 2. A Segurança Jurídica como Princípio Estruturante


2.1. Conceito e Dimensões da Segurança Jurídica


A segurança jurídica pode ser compreendida em duas dimensões principais: a objetiva, que se refere à clareza, coerência e estabilidade das normas jurídicas; e a subjetiva, que abrange a confiança legítima dos cidadãos na continuidade e previsibilidade do ordenamento jurídico. Como destaca Eros Roberto Grau (2006), a segurança jurídica é "a garantia de que o direito não será surpreendido por alterações abruptas ou imprevisíveis, assegurando a estabilidade das relações sociais" (GRAU, 2006, p. 123).


A doutrina contemporânea reforça que a segurança jurídica não é um fim em si mesma, mas um meio para a realização da justiça e da proteção dos direitos fundamentais. Segundo Humberto Ávila (2009), ela se manifesta na exigência de normas claras, estáveis e aplicadas de forma consistente, de modo a evitar a surpresa e a insegurança nas relações jurídicas (ÁVILA, 2009, p. 89).


2.2. A Tensão entre Eficiência Processual e Segurança Jurídica


A busca por celeridade e economia processual, especialmente no contexto do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), tem levado à adoção de práticas como a flexibilização de formalidades e a ampliação do poder discricionário dos magistrados. Contudo, tais medidas podem colidir com o princípio do devido processo legal, previsto no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal de 1988 (CF/1988), que assegura a todos o direito a um processo justo e equitativo.


Como observa Luiz Guilherme Marinoni (2017), "a eficiência processual não pode ser alcançada às custas da segurança jurídica, pois esta é a base para a confiança no sistema judicial" (MARINONI, 2017, p. 45). A flexibilização excessiva de garantias processuais, como o contraditório e a ampla defesa, pode gerar decisões imprevisíveis, comprometendo a estabilidade das relações jurídicas.


3. A Estabilidade Normativa e a Confiança Legítima como Expressões da Segurança Jurídica


3.1. Estabilidade Normativa


A estabilidade normativa refere-se à necessidade de que o ordenamento jurídico seja coerente e previsível, evitando alterações abruptas que desestabilizem as expectativas dos cidadãos. Como aponta Tércio Sampaio Ferraz Jr. (2010), "a segurança jurídica exige que as normas sejam aplicadas de forma consistente, de modo que os indivíduos possam planejar suas condutas com base em regras estáveis" (FERRAZ JR., 2010, p. 67).


No contexto processual, a estabilidade normativa se manifesta na aplicação uniforme de precedentes judiciais e na observância rigorosa das normas processuais. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) reforça essa ideia. No julgamento do Recurso Extraordinário nº 636.553/RS, o STF destacou que "a segurança jurídica é um princípio constitucional que impõe a previsibilidade e a estabilidade na aplicação do direito, vedando alterações interpretativas que violem a confiança legítima" (STF, RE 636.553/RS, Rel. Min. Luiz Fux, 2014).

 

3.2. Confiança Legítima


A confiança legítima, por sua vez, é a expectativa razoável de que o Estado e suas instituições agirão de forma coerente e respeitarão os direitos adquiridos e as situações jurídicas consolidadas. Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2020), "a confiança legítima é um corolário da segurança jurídica, protegendo o cidadão contra mudanças inesperadas que frustrem suas expectativas legítimas" (DI PIETRO, 2020, p. 112).


No âmbito processual, a confiança legítima se traduz na garantia de que as partes terão suas expectativas processuais respeitadas, especialmente no que tange ao contraditório, à imparcialidade do julgador e à observância das regras processuais. A violação dessas garantias, sob o pretexto de celeridade, pode gerar insegurança jurídica e comprometer a legitimidade do sistema judicial.


 4. Jurisprudência e a Defesa da Segurança Jurídica


A jurisprudência brasileira tem se posicionado de forma firme na defesa da segurança jurídica como princípio inafastável. No julgamento do Habeas Corpus nº 126.292/SP, o STF reconheceu que a execução antecipada da pena, sem o trânsito em julgado, violava o princípio da presunção de inocência, comprometendo a segurança jurídica (STF, HC 126.292/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, 2016). Esse precedente demonstra que a busca por celeridade não pode se sobrepor às garantias constitucionais.


Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Recurso Especial nº 1.456.897/SP, enfatizou que "a segurança jurídica exige a observância estrita do devido processo legal, sendo inadmissível a flexibilização de garantias processuais em nome da economia processual" (STJ, REsp 1.456.897/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 2015).


 5. Uma Abordagem Inédita: A Segurança Jurídica como Garantia de Legitimidade Social


A tese proposta neste artigo é que a segurança jurídica, expressa pela estabilidade normativa e pela confiança legítima, não apenas protege as relações jurídicas, mas também funciona como um mecanismo de legitimidade social do sistema jurídico. Em um contexto de crescente desconfiança nas instituições, a segurança jurídica é o elo que conecta o cidadão ao Estado, garantindo que o direito seja percebido como justo e confiável.


Essa abordagem inédita destaca que a segurança jurídica não é apenas um princípio técnico-jurídico, mas um valor social que promove a coesão e a estabilidade da ordem democrática. A flexibilização de garantias processuais, embora justificada pela eficiência, pode gerar um efeito cascata de descrédito no sistema judicial, minando a confiança dos cidadãos e comprometendo a própria eficácia do direito.


 6. Conclusão


A segurança jurídica, manifestada pela estabilidade normativa e pela confiança legítima, é um princípio inegociável do Estado de Direito. A busca por informalidade, celeridade e economia processual, embora legítima, não pode justificar o descumprimento do devido processo legal ou a desestabilização das relações jurídicas. Como demonstrado pela doutrina, jurisprudência e artigos jurídicos, a segurança jurídica é a base para a previsibilidade, a confiança e a legitimidade do sistema jurídico.


Propõe-se, portanto, que a eficiência processual seja alcançada por meio de medidas que respeitem as garantias constitucionais, como a utilização de tecnologias para agilizar os trâmites processuais, sem comprometer o contraditório, a ampla defesa e a estabilidade normativa. Somente assim será possível conciliar a celeridade com a segurança jurídica, assegurando a proteção dos direitos fundamentais e a confiança na justiça.


Referências Bibliográficas


ÁVILA, Humberto. Segurança Jurídica: entre permanência, mudança e realização no direito tributário. São Paulo: Malheiros, 2009.


DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 33ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.


FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito: técnica, decisão, dominação. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2010.


GRAU, Eros Roberto. O Direito Posto e o Direito Pressuposto. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006.


MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 13ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.


BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 636.553/RS, Relator Ministro Luiz Fux, julgado em 2014.


BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 126.292/SP, Relator Ministro Teori Zavascki, julgado em 2016.


BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.456.897/SP, Relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em 2015.


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